São Francisco, o coração pulsante da Cidade Morena: história, cultura e transformação

O bairro São Francisco é um dos mais tradicionais e multifacetados da Cidade Morena. Conhecido por sua rica história, diversidade comercial e cultural, ele se destaca como coração da cidade, onde passado e presente se encontram em cada esquina, em meio à transformação urbana.

Entre vizinhos que se cumprimentam nas caminhadas e conversas à beira da calçada, os encontros nos comércios da região são rotina que contrasta uma rara combinação: a tranquilidade de bairro e a energia de um centro em constante evolução.

Arquitetura tradicional e a contemporânea em harmonia

História e origem

Conhecido como “Cascudo” antigamente, ganhou o apelido graças à grande quantidade de peixes cascudos encontrados no córrego do Segredo, que corta a região. Na década de 1950, o prefeito Fernando Corrêa da Costa mudou o nome do bairro em homenagem à Igreja São Francisco de Assis, construída em um terreno doado por um morador. A igreja marcou a chegada da Ordem Franciscana na cidade e foi concluída em 1956, tornando-se cartão-postal e símbolo da identidade local.

A igreja, consagrada ao santo padroeiro dos animais e da natureza, promove muitos eventos, dentre os quais se destaca a Bênção dos Animais, um evento tradicional que acontece próximo ao dia 4 de outubro, que é o Dia Mundial dos Animais e o Dia de São Francisco de Assis. Neste evento, bichos de diversas espécies recebem a bênção do santo.

Delimitação, comércio e ligações

O São Francisco é um bairro de dimensão significativa e de limites que se confundem com áreas próximas. Com forte presença comercial, destaca-se pela variedade de estabelecimentos e pela localização estratégica, bem próxima ao centro da cidade.

O comércio local é vibrante e diversificado, com vias pujantes e movimentadas, como a Avenida Mato Grosso, a Mascarenhas de Moraes, a Arthur Jorge e, no extremo oposto, temos a Esplanada Ferroviária, com a tradicional Feira Central e o conjunto ferroviário tombado pelo patrimônio histórico.

Essas ruas ligam o bairro a outras regiões da cidade e concentram serviços que sustentam a vida dos moradores. Nos limites do bairro temos a Vila Planalto, Cabreúva, Monte Castelo, Estrela do Sul, entre outros.

Consuelo mora há mais de 50 anos no bairro

Desafios e transformações urbanas

Nos últimos anos, o bairro tem passado por um constante processo de adensamento, com edifícios modernos e condomínios sendo construídos em harmonia com as construções horizontais e imóveis antigos.

Um modelo de sucesso de ocupação dos vazios urbanos. com preservação da memória e da identidade local, ao mesmo tempo em que representa crescimento e renovação de forma equilibrada com a comunidade.

Personagens e histórias do bairro

Conversamos com moradores antigos, comerciantes e trabalhadores do comércio da região, que compartilharam suas visões sobre o São Francisco e suas transformações.

D. Consuelo mora há mais de 50 anos no bairro, é aposentada e continua trabalhando. Enfermeira e instrumentadora cirúrgica, passou pela Santa Casa, Clínica Campo Grande (atualmente Procardio) e Maternidade Cândido Mariano. Viu a região se transformar e considera um lugar muito agradável de se morar, tem ótimos vizinhos antigos e adora sentar na frente da sua casa para ver o movimento, enquanto conversa com as pessoas que passam. Criou ali os três filhos, todos bem encaminhados na vida: Luciano é engenheiro, Luciana é enfermeira e Fernando é perito policial.

D. Ivanir deu continuidade à Conveniência Vai ou Racha, fundada por seu pai na década de 1950. Ela e as irmãs mantiveram o legado do pai até 2017, quando os prédios comerciais da família foram demolidos e parte do terreno foi arrendado para uma rede de farmácias. A história do Vai ou Racha se confunde com a do bairro São Francisco. Nos últimos tempos, a conveniência havia aberto espaço para os movimentos da cena alternativa da cidade, como teatro e música, e se transformado num ponto de encontro dos jovens.

Memórias dividem espaço com o desenvolvimento

Danilo Diniz tem uma loja de variedades, a Ponto Útil, há três anos, oferecendo miudezas e utensílios domésticos como vassouras, rodos, itens de jardinagem e produtos de informática, como pen drives e mouses. Morador do São Francisco há dezesseis anos, Danilo conta que, com o progresso e a construção dos prédios, veio também o intenso tráfego de veículos, que ele observa passar em frente ao seu negócio, principalmente nos horários de pico.

Félix, Waldomiro e Eduardo, amigos e torcedores do Operário Futebol Clube, contabilizam mais de 40 anos de amizade, tendo crescido no bairro. Lembram, com saudade, da época em que o bairro era bem mais tranquilo e eles brincavam pelas ruas. Citaram a sapataria do seu Carlos da década de 1980 e que próximo dela, abaixo da linha dos trilhos, havia outro senhor que fabricava baldes e artigos de lata e estanho, bem nos fundos de onde hoje é o Comper São Francisco. Daqueles tempos, lembram da austeridade dos pais — um deles conta que o pai passava a mão no cabelo e, se estivesse grande, logo mandava cortar, para ficar alinhado.

Maria Salete, moradora há 30 anos

D. Maria Salete, que mora na Rua Júlio Dittmar, conta que ama o São Francisco, onde vive há mais de 30 anos, vinda de Palmeira dos Índios, no estado de Alagoas, fala com saudades de quando não havia praticamente nenhuma outra casa em frente à sua. Ela ajuda a filha a cuidar da loja de confecções em frente de casa, a Sandra Presentes, e as duas não costumam sair muito, mas gostam de ter um supermercado da rede Comper bem pertinho e também frequentam a Igreja São Francisco, a poucos metros de distância. No mais, D. Maria vive de sua aposentadoria e dos aluguéis das casas que ela e os irmãos herdaram dos pais — duas pequenas vilas na mesma rua em que mora. Ela reafirma que o bairro é tranquilo, que a vizinhança é muito boa.

Nabor Marques, proprietário Fornello

Nabor Marques, um dos comerciantes mais tradicionais da região, é proprietário da Padaria Fornello, inaugurada em 1992. Tendo começado a trabalhar aos 14 anos, ele conta que fez um curso de panificação no Senac e passou um ano na unidade de Águas de São Pedro (SP). Chegou a Campo Grande em 1989 para auxiliar na transição do antigo Jumbo-Eletro para o Extra (hoje extinto), e depois trabalhou no Carrefour. Quando surgiu a oportunidade de adquirir a Fornello, recém-inaugurada, abraçou a chance junto com o irmão.

De lá para cá, viu o bairro crescer: no início, a região tinha campos de futebol e terrenos vazios, onde hoje são prédios e um comércio variado. Nabor está todos os dias na padaria e conhece bem a clientela: “Quando um cliente não aparece no horário de costume, a gente até sente falta”, comenta.

Adriana Santos, gerente do Hortifruti Santa Rita, diz que está na casa há cinco anos e nesse tempo, viu o movimento crescer e cita a loja como um exemplo de comércio que conquistou os moradores. Os dias mais movimentados são as quartas e quintas, quando as promoções do setor de hortifrutigranjeiros atraem clientes de vários pontos da cidade.

Janaína Takei e Ana Carolina Freitas, colaboradoras da loja Casa.Com na rua Arthur Jorge, destacam a chegada da academia Engenharia do Corpo e do Super Divertidoos como um impulso para a região. Janaína, que já morou nas redondezas, cita ainda o Burger 180, no Centro Comercial São Jorge, e os sobás do K10 Lanches e do Massa Sobaria, na rua Pernambuco, como opções que atraem não só moradores, mas também visitantes.

São Francisco foi o primeiro bairro a ter uma loja Comper, inaugurada em 1984

Serviços e qualidade de vida

O bairro é bem servido de supermercados: dois Comper próximos (São Francisco e Ipê), o Hortifruti Santa Rita, o Arapongas (antigo Sacolão do Goiaba) e o Symplê (antigo Legal). O bairro abriga instituições de peso na educação, como as escolas públicas EE São Francisco, EM Nicolau Fragelli, EE 26 de Agosto, os particulares Colégio Nota 10 e Colégio São Francisco e a Unigran, de ensino superior.

Há muitas galerias espalhadas pela região, com diversos pontos como conveniências, lanchonetes, lojas de roupas e outros. Para garantir a manutenção da saúde, várias academias estão à disposição da população local e são lugares de encontro de gerações, com gente de todas as idades frequentando a Blue Fit, Positivamente e a Engenharia do Corpo. No entorno da Santa Casa de Campo Grande — maior e mais completo hospital da região Centro-Oeste — há muitas clínicas e laboratórios, como a Ultramedical, LAC Laboratório de Análise Patológica e Citológica e a Histolab-MS, além de comércio de artigos hospitalares, consolidando o São Francisco como polo de serviços de saúde.

Ipê e bairro São Francisco: dois patrimônios da identidade campo-grandense

São Francisco, a essência do campo-grandense

O São Francisco é um bairro que traduz a essência da cidade, misturando tradição, comércio e cultura, enquanto vivencia a modernização. A cidade é fruto da miscigenação de muitos povos, tanto do Brasil como dos países vizinhos e o bairro também tem essa lógica. Na arquitetura, mescla casas muito antigas com outras mais modernas, testemunhando o crescimento de prédios e condomínios que contribuem para aumentar o número de moradores na região e as opções para qualidade de vida. Por ser próximo ao centro, oferece muita comodidade aos moradores e fácil acesso ao lazer, ao comércio e à gastronomia, tanto da região quanto dos bairros vizinhos.

Conhecer suas ruas, pessoas e histórias é essencial para entender o presente e o futuro da Cidade Morena.

Texto e Fotos: Guto Oliveira (@senhordosroles)