*Por Gustavo Shiota
A decisão de suspender por 240 dias a emissão de licenças para empreendimentos no entorno do Parque Estadual do Prosa é apresentada como uma vitória ambiental. Mas, por trás do discurso verde, está um “ambientalismo de ocasião” que, longe de proteger a cidade, ameaça seu futuro econômico, social e ambiental.
Nos últimos meses, o debate sobre a ocupação da região começou com ataques à densidade urbana, sustentados por números irreais e incoerentes. Quando esses argumentos ruíram diante dos dados técnicos, o foco mudou para a pauta ambiental. Agora, o embargo surge como a solução “rápida”, mas não como a solução correta.
O paradoxo ambiental
A ausência de desenvolvimento ordenado em áreas urbanas sensíveis não preserva a natureza, pelo contrário: multiplica erosões e degradação do solo; mantém sistemas precários de coleta e descarte de lixo; preserva áreas abandonadas, inseguras para pessoas e animais; impede a implantação de infraestrutura básica como drenagem, pavimentação e esgotamento sanitário.
Negar a ocupação planejada é condenar o entorno do parque a um ciclo de degradação silenciosa.
NIMBY travestido de proteção
Parte das vozes contra o desenvolvimento da região atua movida por interesses locais: o “Not In My Backyard”. Não querem vizinhos, movimento ou transformações perto de casa. Usam a pauta ambiental como escudo para preservar a própria paisagem, ainda que isso signifique travar avanços para toda a cidade.
A insegurança jurídica e seus efeitos irreversíveis
Embargos genéricos e sem critérios técnicos transparentes geram um dano que vai muito além dos 240 dias:
- Afugentam investidores que já cogitavam aportar capital na cidade;
- Colocam em dúvida a estabilidade das regras urbanísticas;
- Desestimulam novas incorporações, pela percepção de que decisões políticas podem se sobrepor a marcos legais e técnicos a qualquer momento.
O impacto disso não é imediato, mas é irreversível. Projetos que deixam de ser concebidos hoje não voltarão daqui a dois anos. Eles irão para outras cidades, outros estados… e Campo Grande ficará com o prejuízo.
Desinformação como estratégia
A narrativa contrária ao desenvolvimento da região é construída com distorções:
- Acusam redução da área permeável, quando ela quase triplicou — de 12,5% para até 30% em algumas regiões.
- Criticam o Índice de Relevância Ambiental, ignorando que se trata de um dos instrumentos mais rigorosos do país, fruto de estudo técnico e avançado.
Ao sustentar essas inverdades, atacam indiretamente: técnicos da prefeitura; órgãos ambientais como o Imasul; entidades profissionais como CREA e CAU; conselhos democaráticos como a CMDU, universidades e especialistas independentes.
Nesse roteiro, o “vilão” é sempre o empreendedor, justamente quem financia infraestrutura, gera empregos, paga tributos e, muitas vezes, executa reparações ambientais que o poder público não conseguiria realizar.
O efeito dominó no emprego e na renda
Cada empreendimento paralisado significa:
- pedreiros, eletricistas, engenheiros, arquitetos, advogados e lojistas sem trabalho;
- prestadores de serviço, marmitarias, cafeterias e pequenas empresas sem clientes;
- menos arrecadação tributária para o município e para o estado.
Para quem já tem renda garantida, o embargo pode parecer uma conquista. Para quem depende da cadeia da construção civil, é a perda da única fonte de sustento.
A incoerência institucional
Na revisão do Plano Diretor de 2018/2019, todos os órgãos — incluindo Ministério Público, governo estadual, prefeitura, entidades de classe e sociedade civil — participaram da definição das regras hoje questionadas. Agora, muitos dos que assinaram esse processo atuam como se ele fosse ilegítimo.
O mais paradoxal: o Plano Diretor será revisado em breve. Haveria espaço democrático para discutir ajustes. Mas preferiu-se o atalho do embargo, atropelando anos de debate e gerando um caos regulatório.
O alerta que ainda precisa ser ouvido
O embargo no Parque do Prosa não será lembrado como uma medida ambiental de sucesso, mas como um ponto de virada negativo para Campo Grande: o momento em que a cidade passou a ser vista como um ambiente de negócios instável, onde regras técnicas e segurança jurídica podem ser substituídas por decisões políticas de ocasião.
Esse tipo de instabilidade não se corrige com um “desembargo” daqui a alguns meses. O investimento perdido hoje dificilmente voltará amanhã. E os empregos, a renda e a infraestrutura que deixaremos de ganhar serão uma perda definitiva.
Campo Grande está prestes a pagar caro por uma decisão precipitada. E quando os efeitos se tornarem visíveis, será tarde demais para reverter.
* Gustavo Shiota é arquiteto e urbanista, empresário, professor universitário (UCDB), presidente da Acomasul, Conselheiro do CAU e Conselheiro da CMDU

